
Vem então o Silvano Vinceti, o tal remexedor do que não deve, e se põe a desenterrar ossos no pequeno cemitério de San Sebastiano, na igualmente exígua vila de Porto Ercole, onde, dizem, o mestre do chiaroscuro fora enterrado. Desenterrou meia dúzia de ossadas e, usando métodos altamente científicos (provavelmente o uni-du-ni-tê), escolheu uma delas. Daí concluiu que a principal causa da morte do pintor foi o envenenamento por chumbo.
Ser morto por chumbo não é exatamente um exclusivismo, embora a maioria das vítimas deste metal pesado não tenha tempo de se envenenar. Mas e daí, se Caravaggio não morreu apenas pelos ferimentos de sua derradeira briga, dizem que encomendada pelos parentes do homem que ele matara em Roma? Para a arte, isso tem a mesma importância da famosíssima orelha do Van Gogh: nenhuma. Mas se nem o digno, probo e refinado Pico della Mirandola escapou da xeretice do Silvano, que também atribuiu a morte do filósofo ao veneno, por que o coitado do Caravaggio, cheio de culpas no cartório, escaparia?
Dele, materialmente, restaram apenas os poucos ossos da foto acima (se é que são dele). Deixemos que o Silvano Vinceti cuide dos ossos, nós cuidaremos de sua arte.